segunda-feira, 25 de dezembro de 2006

Joanna Newsom - The Milk-Eyed Mender LP

Todos os que perderam a infância nos trilhos da memória podem aqui imaginar como seria o mundo construído pelas mãos de crianças.Ao entrarmos dentro da música temos de tirar os sapatos, fazer pouco barulho e ficar a um canto, pois lá dentro está uma menina cantando para nós palavras sobre pequenas histórias que tocam-nos por dentro com as pontas dos dedos. As melodias estranhas entranham-se, uma após outra, para que nunca mais sonhemos da mesma forma. A voz de menina perdida não lhe permite ser adulta, mas ao ouvirmo-la também percebemos que não é isso que ela deseja. Joanna Newsom tem toda a liberdade das crianças, pois nós os mais velhos, quando tentamos ser assim, chamam e tratam-nos como loucos.Afirmar que este disco é freak-folk seria o mesmo que afirmar que o céu é simples azul. O som da harpa, piano, slide-guitar, piano electrónico Wurlitzer, harpsichord e a pureza da voz singular em poesia, são oferendas de seres que vivem escondidos nas florestas das montanhas mais altas...Este álbum é estritamente proibido a maiores de 12 anos. Todos aqueles que não sintam uma criança brincando dentro de si devem esquecer para sempre estas palavras e tentar seguir em frente com as suas vidas.
Drag City, 2004

Magnolia Electric Co - Trials And Errors LP

Caminhando lentamente perdidos nas horas pelas ruas desertas, estamos a coberto do esquecimento da noite. Até que o som de música embate-nos de frente e uma voz conhecida inclina para nós ao sair de um pequeno café-concerto na esquina. Tendo na ideia a confirmação, caminhamos em passos largos, subindo os dois degraus e entrando por uma porta envelhecida. Debaixo da luz amarelecida e atravessando com o olhar a parede de fumo no ar redescobrimos um homem de voz fracturada e reflectiva, afinal sempre era o Jason Molina. A cidade é Bruxelas e estamos em 2003, passados poucos meses do enterrar das cinzas da sua antiga banda Songs:Ohia.O disco é country-rock urbano do midwest sem desvios em redneck ilegal. Os temas são tocados ao vivo por; Molina na voz e guitarra down-tuned, em puro duelo com os solos e rítmos da guitarra de Jason Groth. Ambos acompanhados no pulsar da bateria de Pete Schreiner e pelo emoldurar do baixo de Mike Kapinus e o seu trompete melancólico. O álbum descai para dentro de nós em 72 minutos por entre faixas longas, havendo duas covers de Songs:Ohia : Ring The Bell e Cross The Road.Logo em The Dark Don't Hide It a voz em palavras atira: ...human hearts and pain should never be separate/ they wouldn't tear themselves apart both trying to fit... e depois destas frases tudo o resto em nós tem de fazer sentido.
Secretly Canadian, 2005

M. Ward - Transistor Radio LP

Este disco transmite em traços low-fi vintage imagens esbatidas cobertas de pó da sua própria realidade. Todos os temas são sementes de bluegrass, country e folk que criam um só fruto: a Americana, de uma forma que Matt Ward conseguiu original neste nosso 4º álbum. E como o som da fusão de estilos não acredita em limite algum, nós ao ouvirmos Transistor Radio também não. Sentimos o despertar numa guitarra acústica em One Life Away com uma voz do Delta do Mississipi ouvida de um rádio antigo nos dizendo: to all the people underground/ listening to the sound of the living people/ walking up and down the graves/ well one of them is mine/ I visited my fraulein/ she's only one step away... Num piano, percurssão, guitarra e baixo, acelerados lá vamos nós a passear no Big Boat com a voz nos deixando ver: well, he says he’s got a big boat/ a high roller/ and everybody knows its name/ oh, it’s a big boat and it pumps up the poor boys pride/ says he’s got a big boat, but it’s just a fairy boat and that makes for a short, short ride...O inicio do profundo adormecer surge da guitarra acústica de Lullaby + Exile e a tal voz nos cravejando lentamente com as palavras: oh a trance is a spell/ with a thrill wrapped up inside it/ and try as you might to fight it/ love will get you in the end...E fossem as vidas feitas de música... e este disco seria, em muitas, a banda sonora.
Merge, 2005

The White Stripes - Under Blackpool Lights DVD

A performance dos White Stripes aqui filmada em video Super 8 no The Empress Ballroom no mês de Janeiro de 2004 em Blackpool, leva-nos a acreditar novamente na música moderna tocada ao vivo. A originalidade da realização é de Dick Carruthers e é produzido pela Third Man Films.Não fosse a beleza e o estilo corporal de Meg enquanto actua e diriamos que era o diabo num corpo feminino ao lado do de Jack. Ela acompanha-o na bateria e ele, na guitarra, voz e piano, nunca se esquece dela por um momento. E quando o concerto inicia com When I Hear My Name torna-se impossível idealizarmos, ou melhor não queremos que o concerto tenha um fim. Os instrumentos atiram do palco o seu Blues-Rock danificado e isso torna os seus álbuns um segundo plano. Em temas como You're Pretty Good Looking (For A Girl), Seven Nation Army e a cover de Dolly Parton de Jolene conseguem o inevitável: um intenso feed-back positivo da multidão. É importante perceber o contexto de tudo, pois as bandas não acontecem por acaso, e a Meg e o Jack, os irmãos White, não precisam de mais se tiverem-se um ao outro e um palco para viverem.

The Mountain Goats - The Sunset Tree LP

As histórias que somos até entrarmos na idade adulta ouvimo-las nas palavras de John Darnielle em The Sunset Tree, a voz e a alma dos The Mountain Goats. Nesses lugares da memória onde as imagens foram vividas à toa num mundo de cá, nem sempre boas, mas nem por isso más o suficiente para não haver projecção num futuro. O disco é folk-rock simpático apesar da tristeza induzida ao ouvinte pelas estórias de cada traço de vidas apanhadas em cada faixa de som. Este não é complexo, mas sim cristalizado na simplicidade das cordas de uma guitarra acústica e os restantes instrumentos funcionam para nos lembrar e marcar as palavras de Darnielle. Os restantes músicos do álbum são: Peter Hughes (baixo, backing vocals, guitarra), Franklin Bruno (piano, guitarra), Erik Friedlander (violoncelo), Alex DeCarville (bateria) and Scott Solter (teclas). No fim de ouvirmos o disco, ficamos com uma sensação dentro de nós: a de que não vale a pena ficarmos tristes, pois os dias passam na mesma...
4AD Records, 2005

Jolie Holland - Escondida LP

Ao ter o segundo albúm de Jolie Holland por perto temos tudo. E tudo inicia caminho com sascha, uma fusão de jazz-folk creativo, que nos prepara para o resto da viagem do albúm. O piano de Amen cria um fio conductor com o nosso subconsciente que nos faz desejar estar nos anos 50 perdidos nas horas de um bar decadente. Em Mad Tom Of Bedlam somos abandonados a nós próprios com o único apoio de uma percursão jazz e uma voz segura, o que nos vale é termos uma música perfeita. No country-rock de Goodbye California a melodia criada com a percursão, a guitarra acústica, a slide-guitar e a voz abre portas para vaguearmos numa pequena cidade do velho oeste americano imaginário. Darlin' Ukelele deixa-nos a pairar algures num sítio estranho até que a voz de Jolie nos vem buscar. As faixas estão como que escondidas umas nas outras e o que temos a fazer é procurar pelo albúm todo...Jolie toca vários instrumentos em Escondida (guitarra, piano e ukulele) e produz os seus próprios álbuns. E é com um albúm assim que nos fazem sentir vivos ao fim de mais um dia.
Anti Records, 2004

Millionaire - Paradisiac LP

"...Millionaire: trashy and melodic at the same time, heavy, yet danceable..." in site oficial da banda belga. É um som todo ele electrizante em que a bateria quebra as guitarras em pedaços tendo o baixo como única testemunha e os samplers a viciar o ouvinte. A voz de palavras tem de se colocar em pé pra se fazer ouvir rasando por entre o som eléctrico dos instrumentos. A malha sonora é um todo, sem margens para nunca perdermos o sentido onde nos leva. Em momento algum do albúm nos sentimos vazios, pois Tim Vanhamel (voz/guitarra), Bas Remans (baixo), Aldo Struyf (samples e sintetizadores) e Dave Schroyen (bateria)e as mãos do Josh Homme na produção, não deixam que tal nos aconteça. Cada faixa inicia dando-nos de imediato um som a que nos agarrar de forma forte e irreversível. Havendo a seguir tempo e espaço para a sonoridade se alterar sem aviso prévio e de rapidez alucinante. É aqui que ocorre algum experimentalismo controlado. É rock sem margens definidas!
PIAS Recording/Warner, 2005

Mirah - You Think It's Like This But Really It's Like This LP

Este é o primeiro albúm de Mirah ( Mirah Yom Tov Zeitlyn) e diz tudo o que estava para vir no futuro. Toca-nos com a sua voz de menina infantil inofensiva rodeada de sons divertidos essencialmente acústicos, porém com desvios noutros sentidos, como na faixa Small Town em que um orgão antigo nos revela um som tosco que nos faz tropeçar, cair e levantar todos orgulhosos. Deixando o mundo a girar lá fora nas ruas, vivemos neste pop-folk as pequenas histórias de intimidade e cumplicidade de uma menina que nos faz ver que já se faz tarde. Ela nos diz de que é feito o mundo, o mundo da parte de trás das nossas mentes. Um mundo fantástico de oceanos e florestas perdidas dentro de nós cheias de amizade. É fatal perder-se qualquer apego a bad feelings trazidos do mundo exterior, ao ouvir este albúm só existe a verdade das palavras simples.
K Records, 2000

Lightning Bolt - Hypermagic Mountain LP

Debaixo das linhas de baixo e entre as batidas da percurssão desenha-se disformemente o lugar do ouvinte. E é impossível ficarmos indiferentes ao repararmos que somos arrastados para uma viagem sonora de destruição da sanidade por 57 minutos correndo sério risco de sonoramente nos asfixiarmos. Agarrados a este som denso ao fim de duas faixas, sentimo-nos ser exorcizados por uma voz dead-soul que nos dita os caminhos por onde ir e por onde não virar. É um LP rock/noise gravado em três curtas semanas para nos fazer ver que não lhe falta nada e que os limites da imaginação do Brian Gibson (baixo) e do Brian Chippendale (bateria) afinal não têm limites.
Load Records, 2005